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sábado, 4 de agosto de 2012

Quando mais armas significam mais segurança.


Os disparos do “Coringa de Aurora” ainda ecoam nas discussões sobre segurança pública, nas quais, como sempre se vê em circunstâncias semelhantes, impera a polêmica sobre o controle do acesso às armas através de leis mais rígidas. A ideia, é fato, tem muito mais repercussão em países distantes da tragédia - como o Brasil - do que nos Estados Unidos, onde foi ela protagonizada. À distância, é fácil aderir ao simplismo da ideologia de que armas podem ser banidas por leis e que isso acabará com as mortes. Mas, será isso verdade?


As respostas intuitivas são divergentes. De um lado, os desarmamentistas afirmam que sim, que massacres iguais ao de Aurora são causados pela facilidade de acesso às armas. De outro lado, os defensores da legitima defesa respondem que a causa dessas tragédias é, justamente, a impossibilidade de se ir armado aos locais em que elas acontecem, as chamadas “gun-free zones” – como escolas e universidades -, pois isso impede que qualquer um ali presente reaja prontamente ao ataque e a ele ponha fim.

Como intuição não pode nortear a resposta a uma questão tão relevante, há de se socorrer à técnica, aos números e aos fatos, para se entender essa complexa relação entre armas e violência. E, nesse campo, números e fatos são abundantes.

Logo após a tragédia, com a discussão tomando corpo, o jornal britânico “The Guardian” publicou uma matéria[1] – no Brasil repercutida pelo Estadão[2] - sobre a relação entre armas civis e homicídios ao redor do mundo, com números da Small Arms Survey (edição de 2007) e da Organização das Nações Unidas. A conclusão é direta: não há nenhuma possibilidade de se atribuir a quantidade de homicídios em um país à quantidade de armas em circulação com sua população civil.

Pelos dados compilados, no continente americano, o país com mais armas circulando junto à população civil é, com folga, os Estados Unidos, com uma taxa de 88,8 armas para cada 100 habitantes, totalizando aproximadamente 275 milhões de armas civis. O mercado de armas por lá está em franca expansão, com o recorde de vendas alcançado em 2011, ano no qual, apenas na Black Friday, mais tradicional liquidação de um dia no país, foram vendidas 130 mil armas.

Com números assim, caso a relação entre armas e homicídios fosse direta, natural esperar fossem os EUA um país com altíssimos índices de assassinato. Ledo engano. Na mesma época em que bateram o recorde na venda de armas, os EUA alcançaram outra marca histórica: a menor taxa de homicídios em mais de 40 anos, com 4,2 casos para cada grupo de 100 mil habitantes, dos quais menos de três (2,97) mortos por armas de fogo. Desde 1968, quando a população norte-americana sequer havia alcançado a marca de 200 milhões, não havia tão poucos assassinatos em números absolutos, registrando-se que neste intervalo o aumento demográfico foi da ordem de 108 milhões de habitantes, aproximadamente.

Paradoxalmente, sendo o país mais armado das Américas, os EUA são também o país com a menor taxa de homicídios no continente. As duas extremidades concomitantemente ocupadas nas tabelas antagonizadas.

Coincidência? Definitivamente, não.

Ainda no continente americano, caso similar ocorre com a Guiana, terceiro país mais armado e penúltimo nos homicídios com arma de fogo, o que contrasta, por exemplo, com Honduras, país considerado campeão continental nos homicídios por arma de fogo e apenas o 9º na taxa de armas com a população.

Mundo afora, os exemplos se repetem. Na Europa, a Finlândia e a Sérvia têm taxas de armas civis altíssimas, a segunda e a terceira maiores, respectivamente, com índices de homicídios inferiores a 0,5/100mil habitantes. Na Ásia, o Líbano e a Turquia são os países com populações mais armadas, mas não figuram nem entre os oito com mais homicídios. Já na África, as Ilhas Maurício são a nação com a maior taxa de armamento civil e, ao mesmo tempo, a penúltima na taxa de homicídios praticados com armas de fogo.

No Brasil, os números reforçam a relação constatada pelo mundo, mas pela conclusão oposta. Traçando-se um paralelo analítico entre os dados brasileiros e os estadunidenses, constata-se não se poder atribuir altas taxas de homicídio às armas civis, muito menos – este o grande exemplo – tentar reduzir tais crimes pelo banimento destas armas. Por aqui, a taxa de armas com a população é muitíssimas vezes menor que a dos EUA, próxima de 0,35  para cada 100 habitantes. Ao mesmo tempo, a taxa de homicídios com armas de fogo (18,1/100mil) é mais de seis vezes maior do que a dos EUA (2,97/100mil). Nas taxas gerais de homicídio – praticados por qualquer meio -, a relação não muda: 27/100mil contra 4,2/100mil.

A realidade brasileira, portanto, mostra que, por aqui, se tem proporcionalmente muitas vezes menos armas e muitas vezes mais homicídios. Além disso, o exemplo nacional na experiência desarmamentista é prova inconteste da impropriedade da relação ora discutida, pois, se a teoria de “menos armas, menos homicídios” funcionasse, o Brasil seria hoje a nação com dados recorde de pacificação social no mundo.

Isso porque, desde que por aqui se começou a implantar políticas restritivas à posse a ao porte de armas por cidadãos civis, o comércio de armas e munições foi reduzido em mais de 90%. Em 2002, havia no país, segundo dados da Polícia Federal, 2,4mil estabelecimentos registrados para esse comércio, dos quais, em 2008, restavam somente 280. Para os mesmos anos, contudo, os dados registrados no Mapa da Violência mostram que a drástica redução no comércio de armas e munições não impôs nenhuma redução nos homicídios, os quais, ao contrário, aumentaram. Em 2002, o estudo do Instituto Sangari, adotado oficialmente pelo Ministério da Justiça, registrou no país 49.695 assassinatos e, em 2008, 50.113, ou seja, mesmo com a quase extinção prática do comércio civil de armas e munições, os homicídios cresceram.

Diante dessa profusão de indicadores, sejam brasileiros, sejam mundiais, como sustentar a teoria de que mais armas representam mais homicídios?

A tarefa é inglória, verdadeiramente impossível dentro da lógica, a ponto de hoje não ser assumida sequer pela Organização das Nações Unidas, que, no maior e mais amplo estudo sobre homicídios já realizado, o “Global Study on Homicide[3], surpreendeu o mundo ao reconhecer que a teoria de desarmamento civil, sustentada por ela há mais de 50 anos, simplesmente não pode ser provada.

Com efeito, à vista das estatísticas apresentadas para a relação entre armas e homicídios nos diversos países pesquisados, incluindo-se o Brasil, nota-se que, mesmo não se podendo estabelecer uma fórmula de equivalência para os dois dados, ao menos fica patente para qualquer analista que os destaques dentre os países com menos homicídios são, exatamente, aqueles nos quais as populações têm mais armas, bem assim que reduzir sua circulação legalmente na sociedade não tem como reflexo a redução no número de crimes de morte.

Nos casos predominantes, portanto, não há outra conclusão a não ser a de que, na prática, mais armas civis tornam uma sociedade mais segura. Fora disso, o que se tem é o apego intuitivo à ideologia desarmamentista, cada dia com menos adeptos e argumentos para subsistir frente à crua realidade dos números.

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Fabricio Rebelo | bacharel em direito, pesquisador em segurança pública, coordenador regional (NE) e diretor na ONG Movimento Viva Brasil, coordenador da Rede Brasil Seguro e colaborador do blog @DefesaArmada.

3 comentários:

  1. Nelson de Azevedo Neto5 de agosto de 2012 às 13:12

    Muito Bem!... Mais uma vez "os números" só vem à comprovar o que qualquer cidadão, mesmo que dotado de um mínimo de massa encefálica funcional, já sabia... Pois bastaríanos atentar para o óbvio:

    - Se as armas-de-fogo fossem a real CAUSA e/ou motivação dos altos índices de violência, a quantidade de homicídios dentro dos quartéis militares seriam altíssimos!

    - Se as armas-de-fogo fossem a real CAUSA e/ou motivação dos altos índices de violência, o número de homicídios dentro das instalações das institituições policiais também seriam enormes!

    - Se as armas-de-fogo fossem a real CAUSA e/ou motivação dos altos índices de violência, não haveriam mais associados de clubes de tiro, ou caça, vivos!...

    Enfim, o que os militantes pseudo-desarmamentistas conseguiram com esta leviana falácia foi quase destruir a parte boa e salutar da relação entre grande parte dos cidadãos deste país e as armas-de-fogo, apenas e simplesmente disceminando as suas más ideias que partem da perpectiva de visão dos facínoras... Ou seja: A visão deformada de bandidos... Em contrapartida, e do meu ângulo de visão, é como quadrilha de bandidos que eu enxergo certos grupos de pseudo-desarmamentistas... E só nos resta agora tentar correr atrás do prejuízo causado à sociedade como um todo... LAMENTÁVEL E REVOLTANTE!

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    1. Nelson de Azevedo Neto5 de agosto de 2012 às 13:30

      Oops!...Errata!... Digo: ... bastaría-nos...; ...instituições...; ... disseminando...; e ... perspectiva...

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  2. Já fui um ferrenho desarmamentista, hoje sou um defensor do porte de arma legal, já notei que muitos demonizam as armas mas mesmo ao tempo esquescem que acidentes de carros e motos matam muito mais que armas - tirando países em guerra - só por isso muitas pessoas deveriam se manterem céticas sobre o tema desarmamento.

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